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Ciência

Covid-19: sentimento de culpa pela transmissão

Psiquiatra Maria Francisca Mauro revela que a intensidade do sentimento é consequência da maneira como a pessoa se comportou dentro da cadeia de transmissão

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Devido à flexibilização da quarentena imposta pela Covid-19, há alguns meses, o convívio social voltou a aumentar. Porém, retomar o contato mais constante com a família e os amigos, ou ser surpreendido por um teste positivo, pode resultar em uma culpa muito grande. Principalmente se o indivíduo se enxergar como possível agente transmissor do vírus.

Segundo a psiquiatra e psicanalista Maria Francisca Mauro, mestre pela UFRJ, a intensidade do sentimento é consequência da maneira como a pessoa se comportou dentro da cadeia de transmissão. De acordo com a especialista, “a forma de experimentar a culpa dependerá das bases emocionais que estão sustentando o funcionamento psíquico e o modo como cada um se posiciona enquanto cidadão”. Para ela, as reações mais comuns são:

– Omissão ou negligência: o indivíduo inicia sintomas característicos do coronavírus ou recebe o resultado do teste positivo, mas permanece passivo, com o pensamento mágico de que nada vai acontecer. Há um negacionismo quanto ao que está acontecendo e a pessoa sublima os fatos;

– Proposital ou intencional: a pessoa sabe que está infectada, entretanto continua sua rotina expondo outras pessoas, mesmo tendo consciência das possíveis consequências;

– Imaginária: sente-se responsável por tudo que possa ocorrer de ruim a outras pessoas e tem remorso devido às suas ações. Tal culpa, no entanto, causa pensamentos catastróficos e desconforto emocional, porém não resulta em ações práticas ou em uma racionalização quanto à extensão da sua real participação no fato;

– Responsável: sente a dimensão da culpa dentro de uma perspectiva da realidade e a contrapõe aos fatos, compreendendo sua responsabilidade e o que foi possível fazer para proteger outras pessoas quando soube do contato com uma pessoa infectada ou quando teve um resultado de exame positivo. Realizou seu isolamento e informou aos contatos.

(Divulgação)

Outros fatores influenciam no sentimento de culpa. Saber que contaminamos alguém próximo não é a mesma coisa que contagiar uma pessoa cujo vínculo emocional é menor. A maneira como a doença evolui é outra determinante. “Administrar os sentimentos e a participação da pessoa nesta cadeia de transmissão dependerá de como ela se posiciona na vida e como processa suas responsabilidades para com terceiros”, diz a Dra. Francisca Mauro.

No entanto, a especialista frisa que sentir-se inteiramente responsável por contagiar alguém não é saudável, nem totalmente realista. Isso porque a maneira como a pessoa infectada se comporta diante da pandemia de Covid-19 também interfere. É importante lembrar que, enquanto não houver uma vacina, existe o consenso de que todos os encontros sociais implicam numa possibilidade de contaminação. “Portanto, não é congruente apenas se torturar emocionalmente. Assume-se o risco de que pode haver consequências para além da experiência daquele momento”, diz a psiquiatra.

De acordo com a Dra. Maria Francisca, “é preciso ponderar que todos estão submetidos a um “real mortal”, amplificado agora pela presença de um vírus, e que cada escolha que assumimos em qualquer situação pode determinar consequências. Não se culpe, não se isente, não se torture, não se aliene.  Seja coerente e tenha responsabilidade social”, conclui.

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