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Carnaval

‘Vou deixar mágica para os outros e vou fazer Carnaval’, diz carnavalesco da São Clemente

Marcelo Adnet é um dos compositores do samba-enredo da escola e teve influência no desenvolvimento do enredo do carnavalesco Jorge Silveira

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Jorge Silveira e Marcelo Adnet. Foto: Reprodução Instagram

Jorge Silveira e Marcelo Adnet. Foto: Reprodução Instagram

Em 2020, a São Clemente levará para a Marquês de Sapucaí o enredo “O Conto do Vigário”, do carnavalesco Jorge Silveira. A temática vai abordar os mais variados tipos de golpes sofridos pelos brasileiros desde o tempo de colônia até os dias atuais, através da internet e o Whats App. Em entrevista à SUPER RÁDIO TUPI, no barracão da escola, na Cidade do Samba, Zona Portuária do Rio, Jorge explanou a maneira que optou por desenvolver o quesito:

“Eu começo contando como essa expressão [O Conto do Vigário] surge. Depois vou setor a setor evoluindo no tempo mostrando o crescimento do Brasil e como isso vai se transformando num cenário ideal para que os vigaristas possam ir aplicando golpes devido a fé e a inocência dos brasileiros. A gente traça essa linha desde o tempo colonial até o Whats App”, contou. E acrescentou:

“De uma maneira geral, no primeiro setor faço a apresentação da expressão. No segundo setor faço a evolução histórica da vigarice até os dias de hoje; no terceiro eu falo da vigarice religiosa, de como a fé é utilizada por espertos para iludir as pessoas; o quarto setor é o político, onde falamos como os políticos usam de suas narrativas e discursos para enganar a população em busca de seus objetivos pessoais; e o último setor é a atualização do vigarista, onde eu vou dizer que o vigarista atravessou o tempo, se modernizou e chegou à era tecnológica e utiliza os recursos que existem hoje, como a internet e o celular, para aplicar golpes e enganar a população. Basicamente é dessa forma que desenvolvi esse enredo”, explicou Jorge.

 

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Está chegando a hora do burro tomar a decisão! #ocontodovigário

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Em meio às dificuldades financeiras que as escolas de samba do Rio de Janeiro atravessam, a São Clemente optou pela criatividade, cores, leveza e irreverência para superá-la. O carnavalesco também comentou sobre o assunto. Disse ter como perfil uma estética mais voltada para charge e o cartoon, estilo de desenho humorístico, animado ou não, de caráter extremamente crítico:

“Isso já é muito meu estilo, algo que gosto de fazer. Eu tenho por referência características muito cartunescas, caricatas, coloridas. Eu gosto de utilizar essa linguagem. Se a São Clemente estivesse num jornal impresso, seria a charge. É a escola que se comunica através do humor. Então, nosso desfile tem como objetivo o resgate dessa linguagem. E isso desde o ano passado com a reedição do ‘E o samba, sambou’. Este ano reforço essa ideia e utilizo tons mais fortes e ainda mais coloridos para passar uma ideia de uma escola quase caricata, quase cartunesca. A proposta é um desfile em forma de piada”, esclareceu.

Parte de uma das alegorias para 2020. Foto: TUPI

Um dos compositores do samba-enredo da escola de Botafogo é o humorista Marcelo Adnet, que participou pela primeira vez da disputa na agremiação. Jorge Silveira relembrou como foi o primeiro encontro entre eles, ainda na fase de criação das obras concorrentes:

“Eu descobri ao pegar a ficha dos compositores. E disse ‘caramba!’. No dia da explanação do enredo para os compositores ele foi o primeiro a chegar. O Adnet chegou de alma pura e participou de maneira genuína da competição. Ele é muito participativo. Vai a todos os ensaios, todas atividades. E não fica no camarote, fica no chão mesmo. Ele é Clementiano, ele é morador de Botafogo e torce pelo Botafogo. A chegada dele foi muito natural”, contou.

Adnet e Matheus Solano durante ensaio de comunidade. Foto: Reprodução Instagram

Jorge também falou da relação com Marcelo Adnet após a disputa de samba:

“No dia seguinte da final de samba-enredo ele veio ao barracão. Ele disse, ‘Jorge, quero ser usado pela escola. Quero contribuir da forma que for. Se você quiser que eu desfile com a tanga do Borat, irei. Farei qualquer coisa pela São Clemente’. E eu respondi: ‘Cara, tudo que eu precisava era isso, predisposição’. Na verdade, a gente quer é que as pessoas se entreguem ao projeto. E ele se entregou”, relembrou.

Segundo o carnavalesco, o humorista teve papel fundamental para a elaboração de uma das alegorias da escola:

“Ele deu contribuições muito legais para o desfile. E posso falar uma que está clara no samba. No samba-enredo tem a frase ‘Chamou o VAR, tá grampeado; Vazou, deu sururu’. Mas não tinha VAR na minha sinopse. Eu não tinha criado isso. Mas ele, como trabalha com o contexto do contemporâneo, tendo uma visão muito afiada, pegou algo da linguagem do carioca e inseriu no samba da São Clemente. Isso acabou gerando uma interpretação minha. Então, a gente vai ter um carro sobre a política que terá uma representação de políticos presos juntos com um juiz que vai assinalar o VAR para serem avaliados. E ao invés de juiz de direito, será o árbitro de futebol que vai dar cartão vermelho e amarelo aos políticos. Isso vai acontecer. Além de várias outras, que veremos no desfile”, contou em tom de mistério.

Ainda sobre a relação de Adnet com a São Clemente, Jorge destacou outro ponto positivo para a escola: a mídia. Para ele, o humorista levou “visibilidade” para a escola do pavilhão amarelo e preto de Botafogo:

“O Adnet acabou trazendo uma visibilidade a São Clemente fora do comum no nosso cotidiano. O fato dele ser humorista, pra mim como artista, é o casamento perfeito. A gente está fazendo, numa escola cômica, um enredo que se propõe o humor, traduzido pela letra de um humorista”, completou.

Parte do abre-alas da São Clemente. Foto: TUPI

Jorge Silveira tem poucos anos assinando desfiles no Carnaval. Apesar de ter nascido em Niterói, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, foi em São Paulo, na escola de samba Dragões da Real, onde assinou seus primeiros desfiles (entre 2015 e 2017). No Rio, estreiou como carnavalesco também em 2017 na Unidos do Viradouro, onde foi vice-campeão da Série A. E desde então assumiu o cargo na São Clemente. Para o artista, os últimos resultados da agremiação (12º e 11º) não o abateram. Ao contrário, o deixaram ainda “mais forte”:

“Eu não me abato. Eu vou vir mais forte e maior. Dessa vez vou pisar no calo de muita gente. Assim como pisaram no meu, vou devolver em Carnaval. Eu vou fazer uma São Clemente muito maior. Tiveram coisas que não tem explicação [em relação ao julgamento do ano passado]. Simplesmente não tem explicação. Eu vou dar trabalho pra eles [julgadores] com muita força. Faremos um desfile carioquíssimo, divertido, gaiato, palhaço. Com uma única pretensão, de despertar a alegria nas pessoas. Essa é a nossa bandeira. Nós somos isso e não temos vergonha. Nós somos a alegria perdida do Carnaval e a gente vai fazer isso valer na Avenida. A gente está com sangue nos olhos. É o décimo ano em sequência no Grupo Especial. Todo ano a escola é apontada como rebaixada. Todo ano dão porrada na gente e todo ano a gente vai incomodar. E a ideia é essa! O nosso lugar é na elite”, desabafou.

Jorge também fez uma reflexão sobre as opções temáticas das outras agremiações do Grupo Especial:

“Das 13 escolas, 12 farão desfiles com narrativas densas, pesadas. A São Clemente quer brincar Carnaval. A nossa pretensão é se divertir e possibilitar que a Marquês de Sapucaí também brinque Carnaval. Eu não estou preocupado com mágica, com o que vou tirar da cartola. Eu quero tirar alegria das pessoas. Eu vou deixar show de mágica para os outros e vou fazer escola de samba. Eu não tenho ala coreografada, não tenho mão pro lado e pro outro. Tenho alegria. Essa é a matéria-prima da São Clemente”, finalizou a entrevista em tom de otimismo e muita vontade de fazer um Carnaval de grandes pretensões.

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