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Cultura

Espetáculo “Nem todo filho vinga” ,do grupo de teatro da Maré, chega ao último final de semana

Produção aborda racismo, direito à cidade, acesso à universidade, políticas públicas na favela e relação com a polícia

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Espetáculo "Nem todo filho vinga" ,do grupo de teatro da Maré
Espetáculo "Nem todo filho vinga" ,do grupo de teatro da Maré (Foto: Divulgação)
Espetáculo "Nem todo filho vinga" ,do grupo de teatro da Maré

Espetáculo “Nem todo filho vinga” ,do grupo de teatro da Maré (Foto: Divulgação)

Racismo, preconceito social, falta de acesso a serviços e oportunidades são dificuldades enfrentadas pelos jovens e moradores de periferia e comunidades cariocas. Essa difícil realidade é tema da peça “Nem todo filho vinga” da Companhia Cria do Beco, da Maré, zona norte do Rio.

Ganhadora do 9° Festival de Teatro Universitário (Festu), em 2019, a produção foi baseada na obra “Pai Contra Mãe”, do escritor Machado de Assis (1839-1908). A cena desenvolvida por jovens universitários, negros, moradores do Complexo de Favelas da Maré e de outras comunidades do Rio, nasceu a partir da provocação feita pelo autor, que termina sua obra literária com a frase que dá título à cena: “Nem todo filho vinga”.

A obra traz a história do personagem Maicon, morador da Maré que, após passar para a Faculdade de Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), passa a confrontar os ideais de justiça do Estado Brasileiro. Diante dos inúmeros eventos de injustiça que ele e seu grupo de amigos vivem diariamente, ao longo do seu ano letivo, Maicon sentirá na pele como as políticas públicas abalam todas as esferas da vida.

Para o ator Jeff Melo, protagonista do espetáculo, o texto traz a narrativa favelada em sua essência, dos atravessamentos diários que o corpo favelado insiste em existir, em persistir na vida, no acesso a faculdade, a cidade e presença nessa sociedade excludente.
“O desconforto vai tocar os olhares preconceituosos de quem não consegue enxergar a favela. Nossa intenção também é fazer com que os nossos amigos favelados se reconheçam nas narrativas.

Espetáculo "Nem todo filho vinga" ,do grupo de teatro da Maré

Espetáculo “Nem todo filho vinga” ,do grupo de teatro da Maré (Foto: Divulgação)

A atuação é interativa entre atores e plateia. Queremos fazer do palco a favela, que se diverte, que faz festa, que ajuda uns aos outros e que vive nessa pluralidade cultural”
Seu personagem Maicon, luta por um pertencimento.
“O personagem fala muito de mim, dos meus amigos e vizinhos da minha comunidade. Maicon é um jovem preto, sonhador e militante. Ele luta diariamente para existir nos espaços de exclusão.

Aos 18 ele passa na faculdade de direito e tem como objetivo ser ‘’justo” e trazer justiça para os seus, mas percebe que o sistema é estrutural e muito mais profundo. A ideia de justiça entrelaça todos os lados da vivência de Maicon: família, amigos, trabalho, faculdade, social… O questionamento atormenta: O que é justo? Será que Nem todo filho vinga? Qual decisão Maicon deve tomar?”

Segundo Renata Tavares, 43 anos, estudante de artes cênicas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (Unirio), professora no Entre Lugares Maré e encenadora do espetáculo, o objetivo é mostrar a relação da universidade com os favelados, falar sobre o embranquecimento do autor e abordar as realidades vividas pelos jovens da favela.

“O ‘Nem Todo Filho Vinga’ está refletindo o momento atual depois do evento com o George Floyd (afro-americano assassinado em Minneapolis- EUA, em maio de 2020, estrangulado por um policial branco durante uma abordagem, por supostamente usar uma nota falsa de vinte dólares em um supermercado); a gente começou a se questionar e discutir sobre os direitos dos pretos, o quanto eles foram escravizados, então, eu acho que é o momento da comunidade preta saber quais são os seus direitos e requerer todos eles, o que lhes pertence”, afirma.

“Nós não vamos sentar com as pessoas e explicar porque o racismo acontece, é questão de ensino e educação, vão ter que tentar entender, porque já se passou bastante tempo e, se não aprenderam até hoje, não vamos ser nós a sentar pacientemente e detalhar. Falta paciência para explicar para os brancos o racismo estrutural, no qual não temos sobrenome, nem as mesmas oportunidades, mas temos que tomar cuidado na rua porque sempre podemos ser alvejados, isso não tem como ensinar para alguém porque só quem é preto é que vive”, conclui.

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