Rio
MPF pede federalização das investigações sobre megaoperação no Rio
Pedido cita indícios de execuções, tortura e risco de responsabilização internacional do Brasil
O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma representação solicitando a federalização das investigações sobre a megaoperação policial realizada nos Complexos da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro. O pedido se baseia em indícios de graves violações de direitos humanos durante a ação.
A solicitação prevê a abertura de um Incidente de Deslocamento de Competência (IDC). Caso o procurador-geral da República, Paulo Gonet, endosse o pedido, caberá ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidir se as investigações serão transferidas para a esfera federal.
Se o STJ autorizar o IDC, a apuração deixará de ser conduzida pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) e pela Justiça estadual, passando a ser de responsabilidade exclusiva da Polícia Federal, do MPF e da Justiça Federal.
Por que o MPF pede a federalização?
De acordo com a representação, assinada pelo procurador da República Eduardo Santos de Oliveira Benones, coordenador do Núcleo de Controle Externo da Atividade Policial, há indícios de execuções sumárias, tortura e mutilações cometidas durante a operação.
O MPF também alertou para o risco de responsabilização internacional do Brasil por descumprimento de tratados de direitos humanos dos quais o país é signatário.
Segundo o documento, a ação policial tinha como objetivo oficial o cumprimento de cerca de 100 mandados de prisão contra integrantes da facção criminosa Comando Vermelho. No entanto, o saldo final foi de aproximadamente 122 mortos, sendo cinco policiais e 117 civis, conforme levantamento da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.
Como foi a operação nos complexos?

A ofensiva mobilizou cerca de 2.500 agentes de segurança, incluindo unidades de elite como o Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e a Coordenadoria de Recursos Especiais (Core). Também foram utilizados helicópteros, drones e 32 veículos blindados.
Ainda segundo o MPF, imagens e vídeos enviados por moradores e organizações sociais mostram corpos decapitados, mutilações, pessoas mortas algemadas, além de facadas e empilhamento de cadáveres em veículos. O material reforça a suspeita de uso excessivo da força e de execuções após rendição.
A representação cita ainda relatos de comentários de deboche atribuídos a agentes de segurança e informa que parte das gravações das câmeras corporais teria sido perdida, segundo a polícia, por “falha técnica”.
Questionamentos sobre imparcialidade
Outro ponto levantado pelo MPF é a participação direta de membros do Ministério Público estadual no planejamento e na execução da operação, o que, segundo o órgão federal, comprometeria a imparcialidade das investigações conduzidas na esfera local.
A Defensoria Pública do Rio também relatou que teria sido impedida de acompanhar necropsias realizadas no Instituto Médico-Legal (IML), no Centro do Rio.
No documento, o MPF afirma que a estratégia da ação se assemelhou mais a uma “missão militar com fins de extermínio” do que ao cumprimento de mandados judiciais. Apenas 17 prisões ocorreram por mandado, enquanto a maioria das detenções foi realizada em flagrante.
O caso aguarda manifestação da Procuradoria-Geral da República e eventual análise do Superior Tribunal de Justiça.
